Sobre a virtude…por Miguel Brambilla
Não é possível dizer simplesmente que a virtude não existe, que todos somos delituosos transgressores e quem sempre faremos concessões ao mal. A realidade as vezes parece tão tosca e surpreendentemente repetitiva, que nos rendemos as enxurradas do passado, bebendo em goles cada gota de cinismo pela garganta seca da solidão.
Reclame virtudes de si mesmo, ao invés de olhar o mundo com o desdém dos amargurados. Seria muito mais interessante se o seu próprio escárnio te devorasse com a frieza do teu julgamento cínico. És um homem estranho, uma mulher sufocada, um amor inconcluso.
Sobre a virtude nada posso dizer além de muitas poças de sangue em que os cavalos dos bárbaros de todos os tempos pisaram para construir a história. Onde chegamos na verdade não sabemos. Mas parece dizer que a geladeira está ficando vazia e já que não haverá petróleo para todos, nem ao menos gasolina, melhor lembrar que ainda existe estricnina para casos emergenciais.
Valha-me a mente do santo, que só pensa na bondade. Que na mulher bem vestida não enxerga a nudez, que no lábio bem pintando não enxerga a malícia, que no oculto da alma, não vê o recalque da perversão.
Quando atingirmos a última hora, na calmaria de um doce nascer do sol em uma praia sem vento nem ondas, vendo as luzes quase estáticas que ofendem de tanta beleza aos olhos do pecador, em pouco tempo, queremos voltar para a fealdade que nos motiva, o defeito do outro, o bisonho, o horrendo, o maldoso.
Quando meus sonhos me trouxerem o futuro novamente, que meu presente não se esqueça disso, por que me parece um estigma profetizar, como a necessidade constante de provar que estamos certos. Competir com preguiçosos é o desafio do gênio, esperar que o ciúmes vença o talento é a violência dos fracos.
Sempre pensei que seria fácil a superação das horas, principalmente quando olhei pra trás e vi o passar dos anos em melodias honrosas da indignação que vivi. Entre miopia e talento, encontrei a loucura, depois a fronteira da santidade que com algumas letras trocadas, facilmente pode se escrever insanidade. São tão parecidas, mas falta apenas o símbolo da cruz. Encontro satisfação em biscoitos de milho em potes estáticos, como se fosse o fantástico mudo em retorno e terror.
O bom da consagração, que tudo que é sem sentido vira pérola distante. Não tem virtude no paraíso, é apenas a linha de chegada. O que haverá depois disso se não há mais contradição? Se o vício não estiver presente, com quem será a comparação? Se não estiverem as espinhas do rosto, o desgrenhar do cabelo, o envelhecimento e a escuridão, para que servem as formas limpas do arco-íris e a pureza de um raio de sol numa manhã de primavera, entre árvores frondosas, aroma de flores e pássaros cantantes?
Sobre a virtude de nosso tempo, só um mundo digital, onde tudo parece o sonho no país das maravilhas, que sobre a lama das hipocrisias, se reconstroem Pôncios, Pilatos e Marias.
Divulgação Sabe Caxias: