Imprensa ignora a conversa dos adolescentes nas redes sobre a invasão da Ucrânia por Carlos Wagner

O que estão falando pelas redes sobre a guerra os adolescentes dos países vizinhos da Ucrânia ? Foto: Reprodução.

Confesso que fiquei surpreso com o interesse dos adolescentes pela guerra entre a Ucrânia e a Rússia. O interesse deles foi despertado nas conversas que tiveram, em inglês, através de aplicativos nas redes sociais, com seus amigos que vivem nos países que faziam parte da extinta União Soviética, que era formada por Ucrânia, Rússia e outros 13 estados. Antes de seguir contando a história uma explicação que julgo necessária. Essa conversa que tive com esse grupo de adolescentes aconteceu por acaso. Eles estavam falando sobre o assunto, eu ouvi, achei interessante e entrei no papo. E por julgar ser um bom assunto estou fazendo um relato aos meus leitores e colegas, principalmente os jovens repórteres que estão na correria das redações cobrindo o dia a dia. Continuando a história. Os adolescentes disseram que o medo dos amigos era que os seus países fossem os próximos a serem invadidos, e que cortassem a internet. Contaram que hoje os seus amigos já têm dificuldades para usar a internet e que precisam recorrer a manobras para não serem importunados pelas autoridades.

Comecei a conversa com eles meio sem jeito, por não ter certeza por onde puxaria o assunto. Então sugeri que assistissem ao documentário The Putin System. Ele é muito didático e mostra a carreira do dirigente russo Vladimir Putin, 69 anos, e dos seus aliados, chamados de oligarcas, que dão as cartas no país nos dias atuais. Recomendei que ficassem atentos aos noticiários. Uma coisa tenho certeza sobre essa conversa. Aprendi muito mais com eles do que eles comigo. Duvido que assistirão ao documentário e aos noticiários. Eles se abastecem de notícias nas conversas entre eles. Nessa conversa eu me dei conta do seguinte. Sempre que dá um rolo da dimensão dessa guerra, nós jornalistas não temos o costume de perguntar para os adolescentes a opinião deles sobre o assunto. No máximo, falamos com aqueles que vivem no lugar dos acontecimentos. Ainda não percebemos que hoje eles, através dos aplicativos, formam uma comunidade globalizada. E estão tomando consciência de que, nas guerras, serão eles que lutarão nos campos de batalha ou perderão parte de suas vidas em um campo de refugiados. Na conversa que tive com os adolescentes lembrei-lhes que nos conflitos entre os países não existem mocinhos e bandidos. Os países envolvidos têm interesses a defender.

No caso da invasão da Ucrânia pelos russos há uma disputa expansionista travada entre a Organização dos Países do Atlântico Norte (OTAN) e Putin, que pretende refundar a união das repúblicas soviéticas. Os dois lados querem aumentar o seu poder sobre os países da região, que são ricos em minerais, petróleo, gás e terras férteis. O principal país da OTAN são os Estados Unidos, do presidente Joe Biden, 79 anos (democrata), que tem uma velha conta a acertar com Putin. Vou falar disso mais à frente. O interesse dos adolescentes na história me fez refletir sobre como estamos noticiando a guerra. Os noticiários estão focados no fato de Putin ter planejando essa invasão há um bom tempo. E que, além de ter uma das mais poderosas forças armadas do mundo, a Rússia é a principal fornecedora de gás natural e petróleo para a Europa e de matéria-prima para adubos para o mundo. Portanto, Putin tem “a faca e o queijo na mão”, como diz o dito popular quando alguém está em uma situação favorável. Inclusive, a velocidade com que as tropas russas avançaram sobre seus alvos no território da Ucrânia lembrou a Blitzkrieg, como ficou conhecida a tática de guerra-relâmpago praticada pelo exército da Alemanha nazista durante a Segunda Guerra Mundial.

Conversei sobre a rapidez do ataque russo com vários colegas que conheci em coberturas durante as quatro décadas e pouco em que sou repórter. A conclusão a que chegamos foi de que os russos liquidariam o assunto em três ou no máximo cinco dias. Foi no meio dos acontecimentos que uma figura começou a tomar corpo, o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, 44 anos, comediante, ator, roteirista e diretor cinematográfico. Cada aparição pública do presidente é como se fosse um capítulo de uma novela que mobiliza uma população e uma plateia para um grande acontecimento. Como no episódio em que o governo dos Estados Unidos se ofereceu para retirar Zelensky da Ucrânia, e ele respondeu: “Preciso de munição, não de carona”. O bom desempenho do presidente da Ucrânia perante a opinião pública soma-se à mobilização que acontece ao redor do mundo contra Putin. O dirigente russo também é um hábil comunicador de massas e construiu a sua imagem perante os russos, como explica detalhadamente o documentário The Putin System. Mas não é páreo para Zelensky. Cabe lembrar aqui o seguinte. Na guerra travada entre Estados Unidos e Vietnã (1965 a 1973), as forças armadas americanas foram derrotadas pela pressão pública contra o conflito, especialmente dos jovens americanos contrários à guerra – há matérias na internet. Lembro-me que assim que os caixões com soldados americanos mortos começaram a aparecer no noticiário noturno das TVs nos Estados Unidos o movimento contra a guerra começou a ganhar corpo.

Na época, havia repórteres de todos os cantos no mundo acompanhando as tropas no Vietnã. Foi essa cobertura que deu visibilidade para a realidade do campo de batalha. E contribuiu para que os militares americanos restringissem a presença de jornalistas no front nas guerras seguintes. No Vietnã, as imagens feitas nos campos de batalha levavam dias para chegar às páginas dos jornais. Hoje, os jornalistas que acompanham os soldados são raros. Mas, graças às novas tecnologias, o que acontece no front e nos arredores é transmitido online e em tempo real para o mundo inteiro. A invasão da Ucrânia está no ar desde que foi disparado o primeiro tiro. Imaginem a velocidade do desgaste da imagem de Putin. A respeito da conta que Biden tem para acertar com Putin. Trata-se da interferência, via internet, dos russos nas eleições presidenciais dos Estados Unidos de 2016, disputadas por Donald Trump (republicano) e Hillary Clinton (democrata). Putin teria intervindo a favor de Trump, que ganhou as eleições e nunca escondeu a sua admiração pelo dirigente russo. Como disse lá no meio do texto. Essa disputa entre a OTAN e Putin não tem bandido nem mocinho. Mas tem a transmissão online permanente dos acontecimentos que ajuda a opinião pública a saber o que está acontecendo. O tempo vai dizer. Mas por tudo que publicamos, Putin deu um passo maior que a perna.

Acesse o blog do repórter Carlos Wagner em:

https://carloswagner.jor.br/blog/

Divulgação Sabe Caxias:

 

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